Artigo nº 8, 1988
O Zohar (VaYishlach [E Jacó Enviou], Item 70) traz evidências de que aquele que ora deve explicar suas palavras adequadamente por meio do que está escrito sobre Jacó, que disse: “Livra-me, peço-Te”. Está escrito: “'Livra-me, peço-Te, da mão de meu irmão, da mão de Esaú, porque eu o temo, que ele venha e me golpeie e às mães de filhos.' Isto implica que aquele que reza a sua oração deve explicar as suas palavras corretamente. Ele disse: ‘Livra-me, peço-Te.’ Parece que devia ter sido suficiente, uma vez que ele não precisa de mais do que libertação. No entanto, ele disse ao Criador: ‘Me havias Tu de dizer que me livraste de Labão?’ Foi por isso que ele explicou, ‘da mão de meu irmão’. E se você disser que outros parentes também são chamados irmãos, como Labão disse para Jacó: Por tu seres meu irmão, me deverias servir de graça?', ele portanto explicou, 'da mão de Esaú.' Qual é o motivo? É porque devemos explicar a questão adequadamente. Se você perguntar: ‘Por que preciso eu de libertação?’ É porque temo que ele venha e me golpeie. Tudo isso é para explicar a questão acima, e não para obscurecê-la.”
É muito difícil entender isto. Quando uma pessoa ora para o Criador, que conhece os pensamentos do homem, devemos interpretar nossas palavras corretamente, ou Ele pode não saber aquilo que a pessoa precisa? Em vez disso, devemos interpretar isto em relação ao homem. Ou seja, a própria pessoa deve saber o que precisa e examinar cada carência separadamente. Uma pessoa não deve dizer, no geral, que ela não está bem e que gostaria que o Criador a ajudasse. O motivo é que existe uma regra: “Não há luz sem um Kli [vaso], não há enchimento sem uma carência.” Portanto, cabe ao homem arranjar para si todas as coisas de que necessita. Isto é, a libertação de Labão não é como a libertação de Esaú, e assim por diante.
Podemos entender isso da maneira que Baal HaSulam disse sobre aquilo que está escrito a respeito de Labão, que disse para Jacó: “Labão respondeu a Jacó: 'As filhas são minhas filhas, e as crianças são minhas crianças, e os rebanhos são meus rebanhos, e tudo aquilo que tu vês é meu.'” Quanto a Esaú, quando ele falou com Jacó, está escrito que Esaú disse o contrário: “E ele disse: 'Que companhia é esta tua que encontrei?' E ele disse, ‘Para encontrar favorecimento aos olhos do meu senhor.' E Esaú disse: 'Eu tenho bastante, meu irmão; deixa que aquilo que é teu seja teu.’ E Jacó disse: ‘então leva o meu presente da minha mão.’”
Ele disse que às vezes a inclinação do mal se veste como Labão, que é justo, e anda com uma roupa branca. Às vezes ela se veste de Esaú, dizendo que o homem já fez tudo por completo, e que não há mais nada a acrescentar, instalando nele um espírito de orgulho. A ordem é que antes do trabalho, ela lhe diz: “Tu não deves entrar no trabalho de Lishmá [pelo bem dela], porque isto é difícil e não é trabalho para ti. Em vez disso, tu, tudo aquilo que tu fazes é para mim, e tu não consegues direcionar que coisa alguma seja pelo bem do Criador.” Com estes argumentos, a inclinação do mal pode impedir a pessoa de se envolver na Torá e Mitsvot [mandamentos/boas ações] de verdade. Isto é antes do trabalho, e este é o significado daquilo que Labão disse: “As filhas são minhas filhas”.
Depois do trabalho, Jacó chega e diz para ele: “Agora vejo que estás certo, que significa que todos os meus pensamentos eram apenas para ti”, ou seja, Lo Lishmá [não pelo bem Dela]. “Portanto, agora devo pedir ao Criador que me dê arrependimento para que eu tenha forças para trabalhar pelo bem do Criador.” A inclinação do mal vem e veste-se de Esaú, da palavra Assiya [fazer/ação], que “Tu realmente fizeste tudo pelo bem do Criador e tu és um grande justo, e tu não és como os teus amigos”. Então Jacó disse para ele: “então leva o meu presente da minha mão”, significando que ele disse: “Eu tenho bastante”, ou seja que todo o trabalho que fiz até agora foi para ti. Mas Esaú disse-lhe: “Deixa que aquilo que é teu seja teu”, que significa que tu não trabalhaste para mim.
Respectivamente, devemos explicar por que precisamos de interpretar “Quando ele ora, ele deve explicar as suas palavras corretamente”. Significando que a própria pessoa deve examinar minuciosamente a ordem do seu trabalho para saber claramente por que deve orar, pois às vezes uma pessoa ora pelo oposto do que ela precisa. A oração é a revelação de uma carência dentro de uma pessoa, pois uma carência é chamada um Kli [vaso], e não há luz sem um Kli. Portanto, a pessoa deve orar para ter um Kli que o Criador preencherá. Se não há um Kli, é impossível falar do Criador preencher a carência.
Isto é semelhante ao que oramos na Oração do Início do Mês: “Que o Senhor conceda favoravelmente os desejos do nosso coração”. “Desejos” são Kelim [plural de Kli]. Quando há Kelim, o Criador pode preencher os Kelim. Devemos entender o que estamos a dizer nesta oração da bênção do mês: “Que o Senhor conceda favoravelmente os desejos do nosso coração”. O que significa adicionarmos a palavra “favoravelmente”? Alguém pediria o desfavorável?
Podemos entender isso com aquilo que O Zohar diz: “Aquele que ora deve explicar as suas palavras corretamente”, como está escrito: “Livra-me da mão do meu irmão”. Labão também é chamado “meu irmão”, pois está escrito que Labão disse a Jacó: “Porque tu és meu irmão”. Foi por isso que ele esclareceu: “da mão de Esaú”.
De acordo com aquilo que Baal HaSulam explicou, às vezes a inclinação do mal é chamada Labão, e às vezes é chamada Esaú. A diferença entre esses nomes está relacionada ao antes e ao depois do facto. Antes do facto, ela chama-se Labão. Depois do facto, ela chama-se Esaú.
Com isto devemos interpretar que quando uma pessoa ora para que o Criador a ajude, já que ela quer fazer alguma boa ação, mas sente que não tem o poder para vencer, ela não deve orar para que o Criador a livre de Esaú, ou seja, pensar em como ele faz tudo não pelo bem do Criador e que o seu trabalho não vale nada. Ela deve pedir ao Criador que a livre das palavras de Esaú, que diz: “O teu trabalho é realmente digno e altamente considerado no alto, e a tua intenção não é de trabalhar para mim”, ou seja, para a inclinação do mal, que agora é considerada Esaú.
Em vez disso, ela quer que o Criador a ajude a sentir que ela está a fazer tudo não pelo bem do Criador, e que veja a verdade – que o seu trabalho é inútil. Segue-se que se ele realmente sente que o seu trabalho não tem valor, o que ganhará em receber tal ajuda do Criador? Certamente não conseguirá fazer nada de bom, pois uma pessoa não consegue trabalhar por uma causa perdida. Em vez disso, é preciso ver algum benefício do trabalho.
Este é o significado daquilo que O Zohar diz que “ela deve explicar as suas palavras corretamente”. Isso é porque uma pessoa deve saber o que está lhe falta para poder observar a Torá e Mitsvot. Por esse motivo, a sua oração deveria ser “Livra-me, peço-Te, das mãos de Labão”, ou seja, por aquilo que Labão a faria ver, que “Tudo o que tu vês me pertence”. Labão afirma que tudo aquilo que ela fez foi pelo seu próprio bem, pelo bem da inclinação do mal e que seu trabalho é inútil.
Nesse momento, ela ora para que o Criador lhe dê essa sensação e para que ela veja que o Criador desfruta de todas as coisas que ela faz, e que cada pequena coisa na espiritualidade é uma questão extremamente importante e que não conseguimos avaliar a sua importância. Então ela terá forças para trabalhar porque agora está a trabalhar com um propósito, ou seja, que com o seu trabalho ela fará uma grande coisa pelo mundo inteiro. É como nossos sábios disseram (Kidushin, p 40), “Rabi Elazar, filho de Rabi Shimon, diz: ‘Visto que o mundo é julgado pela sua maioria, e o indivíduo é julgado pela sua maioria, se ele realizar um Mitsvá [mandamento/boa ação], feliz é ele, pois se sentenciou a si mesmo e ao mundo inteiro para o lado do mérito.’”
Quando ele tem essa sensação, ele certamente consegue energia para o trabalho. Mas se ele pedir: “Livra-me das mãos de Esaú”, isso será para seu detrimento. Como não há luz sem um Kli, quando uma pessoa ora, ela deve “explicar corretamente suas palavras”. O que é “corretamente”? Isso significa que a sua oração deve ser adequada para recepção pois isso é para o seu benefício.
Porém, após o facto, a pessoa deve mudar para a linha esquerda. Ou seja, ela deve examinar e ver se o trabalho estava realmente completo, e verificar se ela tem mais para corrigir para que através da Torá e Mitsvot ela está a praticar, ela alcance Dvekut [adesão] com o Criador. Nesse momento, a inclinação do mal veste-se de Esaú e lhe diz: “Tu não tens nenhum defeito que alguém possa apontar, pois tudo aquilo que tu fazes é somente pelo Criador”. Isto é chamado Esaú, da palavra Assiya [ação/fazer]. Ou seja, que seu trabalho é chamado “trabalho completo” e que não há nada a acrescentar a ele. Nesse momento vem a oração: “Livra-me da mão de meu irmão Esaú, pois quero ter forças para examinar e ver o que devo realmente corrigir”.
Se, depois do facto, ele pedir: “Livra-me do argumento de Labão”, que disse que tudo aquilo que ele fez não foi pelo bem do Criador, mas pelo seu próprio bem, que é a autoridade da inclinação do mal, então ele é controlado por Esaú, que significa que ele está a fazer tudo pelo bem do Criador. Nesse caso, ele permaneceria para sempre com os seus defeitos porque Esaú afirma que não há nada para corrigir e que ele está a fazer tudo pelo bem do Criador. Ele nunca seria capaz de ver a verdade.
É por isso que O Zohar diz que ele deve explicar as suas palavras corretamente. Ou seja, deve-se obter o Kli correcto onde a ajuda correcta possa entrar, pois “Não há luz sem um Kli.” Com isso entenderemos aquilo que perguntamos: “O que significa dizermos que o Criador deve conceder favoravelmente os desejos do nosso coração?” Pediria uma pessoa alguma coisa má ao Criador? Pelo contrário, é que cada oração deve estar no seu lugar.